segunda-feira, setembro 14, 2009

Extinção e sobrevivência

Amigos pescadores
Posto a última matéria, da série de entrevistas, com biólogos pesquisadores que estudam as populações de peixes, inclusive do nosso litoral.
Um abraço a todos.
César Mazzillo




Entrevista com o Prof. Dr. Nelson Fontoura,
Coordenador do Laboratório de Ecologia Aquática da PUCRS.
Bolsista de Produtividade em Pesquisa do
CNPq (Conselho Nacional de Pesquisa)



E – Algumas vezes, lemos nas revistas de pesca que determinadas espécies estão em extinção. Apesar dessas informações presenciamos a captura da espécie citada. Perguntamos como ocorre o processo de extinção?

Prof. Fontoura - Devemos distinguir o que é extinção biológica e extinção econômica. Extinção biológica constitui-se no desaparecimento da espécie, a qual deixa de ser visualizada ou capturada, fazendo com que se presuma que a mesma já não existe na natureza.
A extinção econômica relaciona-se com a pesca com fins comerciais dirigida a espécies de interesse, capturadas com artes de pesca seletivas. Ocorre quando uma determinada espécie se torna gradativamente mais rara, e os custos da operação pesqueira se tornam maiores que o eventual rendimento da pescaria. Neste caso, a atividade pesqueira é abandonada por extinção econômica, embora a espécie ainda esteja presente na natureza.

E – Todos os peixes e crustáceos tem estratégias de sobrevivência iguais?

Prof. Fontoura - Não. Distinguimos dois tipos principais de estratégia de sobrevivência. Existem espécies que investem em ciclos de vida curtos, maturidade sexual precoce, e grande produção de ovos ou filhotes. São as espécies chamadas de "r" estrategistas. Este é o tipo de estratégia de vida que permite o maior nível de extração pesqueira, pois os indivíduos retirados são rapidamente repostos. Sardinhas e camarões se enquadram nesta estratégia.
O outro tipo de estratégia é denominado de "k". São animais mais longevos, que começam a reprodução em idades mais avançadas e produzem um menor número de ovos ou filhotes. É o caso de tubarões e raias. Espécies com este tipo de estratégia de vida suportam níveis de extração pesqueira muito baixos, sob pena de extinção econômica ou mesmo de extinção biológica.

E- O que representa, em termos populacionais, a captura de fêmeas prenhes ou de formas jovens?

Dr. Fontoura - O administrador pesqueiro encara o estoque de uma espécie da mesma forma que os animais de uma fazenda. O objetivo é obter-se a máxima produção presente sem comprometer a produção futura. Neste contexto, abater-se um animal em processo reprodutivo não é inteligente, pois em pouco tempo este mesmo animal já terá liberado na natureza de dezenas a milhares de novos indivíduos. Esta é a lógica que norteia a proibição da captura na piracema, em águas interiores. No caso da plataforma, isto se verifica na captura da corvina. Os indivíduos de maior porte são capturados justamente quando se aproximam da costa para desova, normalmente na primavera.
A captura de filhotes também é um contra-senso. Porque capturar um jovem se daqui ha alguns meses ou anos ele poderá estar com tamanhos muito maiores. O pinto ao primo canto pode ser bom, mas a galinha alimenta muito mais gente. Este é o caso do cação martelo, capturado em grandes quantidades na primavera, em comprimentos de cerca de 40cm. O detalhe é que o animal já nasce com este tamanho, e faminto, é capturado logo ao nascer. Considerando que os tubarões são "k" estrategistas e com populações em declínio, a captura destes animais sem posterior devolução ao mar pode ser considerada como um verdadeiro crime ecológico. Além disto, existe um princípio que torna os predadores extremamente importantes.
O princípio da exclusão competitiva postula que quando duas espécies competem pelo mesmo tipo de recurso alimentar, uma das espécies tenderá a desaparece com o tempo, diminuindo a diversidade biológica. A presença de um predador, entretanto, permite que ambas as espécies convivam, pois as populações são mantidas em densidades mais baixas, minimizando a competição por alimento. Desta forma, os predadores de topo de cadeia, como os tubarões, são espécies fundamentais para a manutenção da diversidade biológica.

E- Existe alguma informação estatística sobre espécies em extinção?

Dr. Fontoura - Existem estudos publicados que atestam para a redução marcante de várias espécies, como a viola (Rhinobatos horkelii) e cação-anjo (Squatina guggenheim, S. occulta). Outras espécies não apresentam estatísticas disponíveis, mas foram abundantes no passado e muito raras atualmente, como o cação-mangona (Charcharias taurus) e o cação-malhado (Mustelus fasciatus).


E- Dr. Fontoura, poderia deixar umas mensagem para os pescadores da Associação dos Usuários da Plataforma de Atlântida.

Dr. Fontoura - De forma geral, as populações de elasmobrânquios (tubarões e raias), por serem "k" estrategistas, estão entrando em colapso. Embora o pescador esportivo possa dizer que um peixinho ou outro não faz diferença proporcionalmente aos barcos de arrasto que passam juntinho da praia, toda a captura de uma espécie vulnerável faz diferença sim. O pescador ambientalmente responsável não deve capturar tubarões e raias; e se capturados vivos, devem ser devolvidos ao mar.

Um comentário:

C.Mazzillo Jr. disse...

Matéria Sensacional! Mais uma vez, ouvimos profissionais falando sobre a importância da preservação, se nao começarmos a ouvi-los, logo teremos de mudar de esporte. E a única maneira de concinetizar os pescadores é reppasando esse tipo de mensagem lá na paltaforma. Por isso, devemos continuar com as medidas de preservação!!
Grande abraço e ótimas pescarias!